Com a chegada do inverno e as baixas temperaturas que acompanham esse período, especialmente na região Sul do país, o cenário nos pesqueiros muda radicalmente. Diferente das épocas mais quentes, em que os peixes permanecem ativos e proporcionam dias lotados de pescarias, as temporadas mais geladas do ano trazem não apenas mudanças no comportamento das espécies, mas também inevitáveis perdas nos empreendimentos de pesca.
Essa estação do ano se caracteriza sempre como uma época difícil para os administradores de pesqueiros, pois os peixes desenvolvem diversas adaptações para lidar com a queda de temperatura da água. Entre elas, destaca-se a redução da taxa metabólica, o que diminui a necessidade de alimento e oxigênio das espécies. É o que explica o biólogo, e pescador esportivo, Leandro Sanches.
“Há algumas espécies que são naturalmente mais adaptadas ao frio. O peixe é um animal de sangue frio, então, quando cai demais a temperatura, seu metabolismo tende a dar uma desacelerada, a digestão fica mais comprometida, lenta, ele vai se alimentar com um pouco menos de frequência, principalmente os animais que não são adaptados a essa queda de temperatura”, explica.
Segundo Leandro, entre os peixes que mais sofrem durante o inverno é possível destacar as espécies que vêm da região norte, amazônica, e que ficaram famosas em pesqueiros, como é o caso das pirararas e tambaquis. “São mais sensíveis, portanto, são os que têm maior impacto na sua fisiologia em condições de águas mais frias”, destaca.

Foto: Fish TV
Quem vive isso de perto é Volnei Sasse, dono do Pesqueiro Arena Sasse. Localizado na cidade de Rodeio, em Santa Catarina, o local já possui perdas expressivas somente nesse primeiro mês de inverno.
“Esse ano estamos tendo um inverno atípico. Existe muita dificuldade com os peixes, principalmente com tambaquis e pirararas, que sofrem muito devido às baixas temperaturas da água. As pirararas já tentei salvar várias vezes, mas sempre tem perdas nessa época. Elas são muito sensíveis e quando a água baixa mais de 25°C, essas espécies acabam morrendo”, relata.
Há cinco anos à frente do pesqueiro, Volnei explica que, neste ano, para lidar com o cenário, ele está implementando um sistema de aquecimento com resistência elétrica, a fim de adequar a temperatura do lago. Segundo ele, o remanejamento dos peixes para outros tanques está fora de cogitação, devido ao grande volume de exemplares.
“Temos cerca de 30 toneladas de peixe. Mover tudo isso seria inviável. Sempre que tentamos mexer, há perdas. Então, optamos por aquecer a água onde eles já estão, instalando um sistema com resistência elétrica para amenizar a situação e fazer com que as perdas não sejam tão grandes”, explica.
Foto: Volnei Sasse
A instalação do sistema de aquecimento é apenas uma das diversas estratégias adotadas por pesqueiros da região Sul para preservar as espécies mais vulneráveis às baixas temperaturas. Medidas como o uso de estufas, ajustes estruturais nos tanques e tecnologias térmicas têm sido aliadas importantes para reduzir as perdas durante a estação mais fria do ano.
Em relação ao impacto financeiro que o inverno causa no pesqueiro, baseado em anos anteriores, ele destaca perdas entre R$ 10 mil e R$ 20 mil somente por conta do frio. Ou seja, para um pesqueiro que cobra R$ 80 pela pescaria diurna e R$ 60 pela noturna, cobrir esta faixa de prejuízo exigiria entre 125 e 250 pescarias diurnas, ou de 167 a 333 pescarias noturnas.
Além disso, há também custos operacionais para manter o funcionamento do espaço durante a estação. Manter o equilíbrio financeiro se torna mais complexo nessa época. Ele explica que consegue fechar as contas, mas com margens de lucro pequenas. A reposição constante de exemplares é fundamental para manter o atrativo do pesqueiro, mesmo com menor fluxo no inverno, quem visita espera encontrar variedade e boas chances de captura e, abrir mão dessas reposições comprometeria o principal atrativo do local. “O pescador chega e quer ter peixe. Se não tem, ele não volta”, completa Volnei.
Foto: Volnei Sasse.
Esse dilema também é enfrentado por outros gestores, que lidam não apenas com a perda de peixes, mas também com o baixo movimento durante o inverno. Igor Gustavo, administrador do Pesqueiro Vacari, no Paraná, relata que a movimentação chega a cair até 80% nesta época do ano, gerando um grande impacto financeiro.
“A nossa região é bem fria, então acaba que os pescadores não vêm com frequência. Os peixes ficam mais difíceis de sair, e as famílias que costumam vir, mesmo tendo um restaurante aqui, evitam, pois é um lugar mais aberto. Assim o movimento cai bruscamente”, disse.
Segundo Igor, o faturamento cai em mais de R$ 100 mil durante os meses mais frios, o que reflete o impacto direto que essa estação tem sobre a pesca esportiva no Sul do país. Para manter a operação viável, ele também precisou adotar estratégias específicas para proteger os peixes das baixas temperaturas. Uma das soluções encontradas no Pesqueiro Vacari envolve o controle da circulação da água e o uso de caldeira para aquecimento parcial dos tanques.
“Aqui nós fechamos a entrada de água, a comporta, e tentamos não movimentar tanto essa água. Também temos uma caldeira que aquece um lado do tanque, onde as pirararas e os tambaquis acabam encostando”, detalha Igor.
Foto: Igor Gustavo.
Essas medidas ajudam a criar um refúgio térmico dentro do próprio tanque, o que aumenta as chances de sobrevivência das espécies mais sensíveis durante os dias mais rigorosos do inverno.
As dificuldades enfrentadas pelos pesqueiros nesta época exigem planejamento prévio e decisões técnicas que podem minimizar os impactos da estação. Segundo Leandro Sanches, uma das alternativas é apostar em espécies mais resistentes ao frio, como pacu, pintado, dourado e piapara, que tendem a sofrer menos com a queda de temperatura.
Outra estratégia recomendada é realizar o remanejamento dos peixes antes da chegada do inverno, enquanto as condições fisiológicas das espécies ainda estão estáveis. “No frio, o sistema imunológico dos peixes já está mais comprometido. Expor eles a mudanças bruscas nessa fase pode agravar a situação”, disse.
Com isso, fica evidente que o inverno impõe não apenas desafios climáticos, mas também operacionais e financeiros para os pesqueiros, principalmente na região sul. A adoção de medidas preventivas e de manejo adequado é essencial para garantir a saúde dos peixes, a continuidade da atividade e a fidelização dos pescadores, mesmo nos meses mais rigorosos do ano.
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