Dizem que o dourado é o senhor absoluto das águas. Ele chega brilhante, com sua cor de ouro líquido, e salta como se o céu fosse seu palco particular. O pescador vibra, o coração dispara, e por um instante parece que nada mais existe além dele. Mas o rio Paraná, com sua vastidão sem fim, guarda segredos que não se revelam a olhos apressados.
Entre suas correntezas, outras histórias também nadam fortes. A corimba, por exemplo, não se deixa intimidar pela fama do dourado. Pequena no tamanho (nem sempre), grande na resistência, luta com bravura, lembrando que a emoção não está apenas na imponência, mas também na persistência da vida que insiste em se mostrar. A piapara, por sua vez, é mais discreta, quase tímida. Requer calma, pede silêncio, convida o pescador a entrar em seu compasso. Não se entrega facilmente, prefere testar a paciência de quem lança a isca. É um jogo de delicadeza e astúcia, onde a vitória não é do mais forte, mas do mais atento.
Foto: Pedro Hertz
E há ainda aquelas surpresas que o rio reserva apenas a quem tem a sorte de estar no lugar certo, na hora certa. Uma piapara rara, enorme, de proporções quase inimagináveis, que rivaliza em tamanho com um dourado. Quando aparece, vira lenda. O pescador que a encontra nunca esquece, e o Paraná, cúmplice silencioso, sorri em suas águas, como quem diz: nem só de um rei se faz um reino.
E eu pude comprovar. Durante gravações do Destinos na pousada Cacim, em Paso de la Patria, quando o dourado, fazendo seu charme não queria dar as caras, uma piapara ou boga, como chamam em espanhol, apareceu e fez história. Não era qualquer piapara, era A piapara. Aproximadamente sete quilos e um tamanho e força que competia com um dourado. Ela mostrou quem manda em uma briga intensa e longa que me fez perceber que quando nos permitimos sermos surpreendidos, e deixamos as coisas fluírem, a natureza mostra sua face.

Foto: Pedro Hertz
Porque o rio é generoso e infinito. Ele não se limita a uma espécie, a uma história, a um brilho. Ele é feito de diversidade, de encontros inesperados, de pequenas e grandes batalhas. É poesia líquida correndo entre as margens, carregando consigo a promessa de que sempre haverá algo novo a descobrir.
No fim, quem se entrega ao Paraná aprende que pescar não é apenas buscar o dourado. É se deixar surpreender pelo inesperado, é reconhecer a beleza que se esconde nos detalhes, é sentir que, a cada arremesso, o rio escreve mais um verso dessa canção sem fim.
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