Como os cardumes se comportam? Estudo revela formações preferidas dos peixes

Autor do estudo conversou exclusivamente com a Fish TV e explicou que as posições tridimensionais em “escada” são as mais apresentadas nos cardumes, o que pode ser importante para o pescador esportivo

Por Marcelo Telles - 08/07/2025 em Notícias / Meio Ambiente

Por décadas, a ciência acreditou que os peixes em cardumes nadavam em formações planas de “diamante”, com o intuito de economizar energia. Essa visão clássica, proposta nos anos 1970, afirmava que esse arranjo permitia aos peixes evitarem as zonas turbulentas deixadas por outros seres nadadores e, ao mesmo tempo, ganharem impulso hidrodinâmico.


No entanto, um estudo recente realizado por pesquisadores das universidades de Princeton e de Harvard derruba essa hipótese com dados inéditos em três dimensões: os peixes preferem nadar em formações de "escada" 3D.


O autor principal do estudo, Hungtang Ko, pós-doutorando da Universidade de Princeton, conversou, com exclusividade, com a Fish TV e explicou como o estudo foi realizado, bem como os seus benefícios para a pesca esportiva.


O artigo, publicado na revista Scientific Reports, mostra que a espécie danos gigantes, peixe frequentemente usado em experimentos, nadam em "escadas", verticalmente, na maior parte do tempo.


Imagem: Fish TV.

Essa formação apareceu em 79% do tempo observado, enquanto a clássica formação de diamante foi identificada em apenas 0,1% dos quadros analisados ao longo de um experimento de 10 horas.


O cardume apresentou os peixes em formação “lado a lado” em apenas 3,9% das vezes estudadas.


A espécie também se apresentou na formação “escalonada” em 7,6% das vezes


Já em 13,6% do tempo, eles estiveram em "linha reta", um atrás do outro.


Foto: Taryn Elliott / Pexels.

Segundo ele, a formação em escada evita esse problema, garantindo os mesmos benefícios hidrodinâmicos do diamante, mas com menos necessidade de coordenação precisa entre os peixes.


Como foi feita a pesquisa?

A equipe usou um sistema de rastreamento por visão computacional em 3D — uma inovação que permitiu acompanhar cada peixe individualmente em tempo real e com alta precisão.


Eles gravaram cardumes nadando por até 10 horas no próprio laboratório experimental da universidade, onde eles têm um fluxo de água circulando constantemente.



"Na seção onde os peixes nadam, a água flui continuamente sobre eles. Assim, todos os peixes podem nadar na mesma direção, como se estivessem em uma piscina infinita ou esteira aquática. Nós os registramos com câmeras de visão lateral e inferior, e usamos técnicas de visão computacional para rastrear as posições relativas dos peixes", explicou Hungtang.


Ele ainda diz que, nessa formação em "escada", há sempre um peixe líder e um peixe seguidor, sendo que o seguidor tende a ficar acima do líder. Eles conseguiram observar esse tipo de relação em pares, em muitos registros.


Foto: Harrison Haines / Pexels.


Os dados também indicam que os peixes ajustam suas formações conforme a velocidade da água. Em fluxos mais intensos, a formação de escada se alonga, o que mostra uma capacidade adaptativa ao ambiente, com o intuito sempre de poupar energia.


"Acreditamos que o comportamento de formação de cardume nos peixes não serve apenas para evitar predadores, mas também é muito útil para economia de energia. Verificamos isso em um estudo anterior, onde medimos a taxa de consumo de oxigênio de um grande cardume em comparação com peixes nadando sozinhos. Descobrimos que nadar em cardume ajuda os peixes a economizarem energia. E este estudo atual sobre a formação em escada reforça a possibilidade de que a posição relativa entre os peixes permite que ocorra uma interação hidrodinâmica benéfica, o que poderia explicar a economia de energia nos cardumes", comentou.


Além das implicações biológicas, o estudo tem desdobramentos tecnológicos. A formação de escada pode inspirar o desenvolvimento de robôs subaquáticos mais eficientes.


Foto: Emma Li / Pexels.


O laboratório de Nagpal já trabalha em grupos de robôs que imitam o movimento dos peixes, com foco em tarefas como monitoramento ambiental de recifes de corais e florestas de algas marinhas. A expectativa é que a adoção de formações em escada traga ganhos significativos de economia energética nesses dispositivos.


Ao explorar um comportamento natural que havia escapado aos modelos bidimensionais por décadas, a pesquisa reformula o entendimento sobre a dinâmica dos cardumes, aproximando a biologia e a engenharia de forma concreta. 



E para o pescador esportivo? No que isso impacta?

Foto: Fish TV.

Trazendo mais para o nosso cenário, da pesca esportiva, o que entender esse cenário pode mudar? O primeiro ponto de atenção é sobre compreender melhor o comportamento dos peixes. Afinal, quanto mais próximos estivermos da rotina dos cardumes, maiores serão as chances de sucesso em uma pescaria. 


Saber que os peixes preferem nadar em formações de escada tridimensionais, por exemplo, ajuda melhor a entender sobre a distribuição do cardume em diferentes profundidades e sobre como eles se movem em conjunto nas águas correntes, principalmente nos canais dos rios, tendo influência direta em onde e como lançar a isca


Além disso, se os peixes se posicionam em diferentes camadas verticais, fica mais fácil compreender a profundidade de trabalho dos equipamentos, além de melhor entender até o uso do sonar.


Quando falamos sobre a pesca esportiva, Hungtang reforçou sobre a interação hidrodinâmica, explicando que ela é muito importante para a economia de energia dos cardumes. E se a pesca for feita sem a devolução do peixe às águas, pode trazer prejuízos a todo o cardume.


"Se o cardume é muito grande, retirar um peixe pode até ter pouco impacto hidrodinâmico. Mas se o cardume é pequeno, digamos que de 5 a 10 peixes, a importância de cada peixe individual é bem maior. Então, se você retira um peixe e não o devolve para a água, há uma grande chance de que os peixes restantes no cardume não consigam mais economizar energia da mesma forma que antes, prejudicando todos aqueles seres", explica o pesquisador.


Assim, o pescador pode buscar estratégias para minimizar interferências, devolvendo o peixe com agilidade, para dar tempo para o cardume se reorganizar, evitando, inclusive, capturar vários indivíduos seguidos do mesmo grupo. 


O estudo mostrou que os cardumes são tridimensionais, dinâmicos e adaptáveis, oferecendo aos pescadores novos caminhos para a pesca esportiva, com mais técnica e ainda mais respeito ao ecossistema. 


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